Dança preservada por seu Zé Coelho colocou o Piauí em evidência no país

“Ô lezeiro…
Vamos vadiar!
Dentro do lezeiro,
Vamos vadiar!
Cavaleiro tire a dama,
Vamos vadiar!
Dama tire o cavaleiro.
Vamos vadiar!”

Balandê Baião - Monsenhor Gil(Foto: Regis Falcão)O convite feito pelos versos de uma das cantigas do Balandê é mais que um convite para brincar um folguedo que há muitas décadas nasceu nas terras onde hoje está a cidade de Monsenhor Gil. A ladainha-chamamento é na verdade a senha para se deixar embarcar na aventura de viver uma cultura tipicamente sertaneja, mestiça, misteriosa, simples, mas que se formos ver mais de perto revela uma complexidade e detalhezinhos únicos, assim como o Piauí.

O Balandê é uma dança de terreiro com ascendência negra, vinda dos escravos, que foi criada pelo mestre Luís Pereira de Andrade, o Zé Coelho, no início do século XX. Mas para entender como ela surgiu é preciso voltar alguns anos antes e compreender o Baião. Não aquele baião imortalizado por outro Luiz, o Gonzaga, mas o Baião dançado no interior do Piauí, surgido também entre os escravos.

Balandê Baião - Monsenhor Gil(Foto: Regis Falcão)

Um dos discípulos do mestre Zé Coelho, o professor de Educação Física, Jozimar de Souza Venção, o Jorginho, explica melhor. “Dizem que o baião começou em Monsenhor Gil em 1926, mas nas minhas pesquisas descobri que em 1875 ele já existia. O conto ‘Terra da Luz’ do escritor da cidade Jônatas Batista em 1912, também refere-se ao baião como uma dança vinda dos escravos”, assegura.

O educador físico diz que segundo o texto, um negro cantador vindo da fazenda grande da localidade Angical, na região da atual Monsenhor Gil, foi vendido para uma outra fazenda em Caxias e na despedida planejaram fazer um grande baião. Ele não queria participar porque estava triste, mas conseguiram que ele fosse e planejaram libertá-lo. Se o conto foi baseado em histórias reais, não se sabe. Mas o fato é que o termo baião já estava sendo usado desde o século XIX para designar uma dança de terreiro, conforme crê Jorginho.

Balandê Baião - Monsenhor Gil(Foto: Regis Falcão)Nascimento
O professor ressalta ainda que em Monsenhor Gil, que era o povoado Lages, de Teresina, e depois virou Vila do Menino Deus de Natal do Piauí até receber seu topônimo atual em 1963, tinha várias danças em sua história. “Em 1875 havia a dança do sarapateado que era dos homens e o saracoteado, parecido com o xaxado, que era das mulheres. Quem me contou foi uma mulher chamada Maria da Cruz”, conta.

Em 25 de agosto de 1921 nasceu o seu Zé Coelho, descendente de negros refugiados do século XIX. Ele aprendeu o baião com a avó. A dança na época era executada por brincantes dispostos em duas filas que bailavam ao som de instrumentos como o berimbau e tambores de troncos de árvores que davam um ritmo acelerado marcado também pela batida dos pés. Zé Coelho aprendeu o folguedo com a avó que o criou, mas uma coisa não lhe agradava no baião.

Balandê Baião - Monsenhor Gil(Foto: Regis Falcão)“Ele dizia que os homens não podiam ter contato com as mulheres. Era proibido. Na década de 1940, como ele queria tocar nas meninas, ele se uniu ao irmão, criou músicas de improviso, e um novo jeito de dançar, em círculo, a partir de outras danças circulares como o Pisa Na Fulô e o Lili. Foi por isso que ele inventou o Balandê”, descreve Jorginho. O Balandê utilizava também instrumentos percussivos entre eles o gafanhoto, exclusivamente seu, uma espécie de castanhola composta por dois pedaços de madeira talhados unidos por um barbante.

Renascimento
Durante anos, o Balandê e o Baião estiveram nas sombras da cultura de Monsenhor Gil, relegados à memória do mestre Zé Coelho e algumas poucas execuções. Foi no ano de 2004 que essa história mudou. O médico Antonio Noronha ganhou o projeto Revelando os Brasis e pôde realizar um curta-metragem sobre as duas danças.

Balandê Baião - Monsenhor Gil(Foto: Regis Falcão)A história de Zé Coelho e a dança do sertão piauiense foram levadas a diversos estados do país e até mesmo para o exterior. Virou um orgulho para Monsenhor Gil e despertou o interesse nas crianças e jovens que pouco ligavam para esse baile “que mais parecia uma macumba”. Antigamente, o folguedo era reservado para os dias santos, após as missas, hoje ele está presente em várias escolas do município.

Um grupo foi formado com dançadores que fazem apresentações levando o peculiar baticum Brasil afora. Atualmente são 28 integrantes, entre eles, Rodrigo de Sousa Santos e Aline Rodrigues Fonseca, ambos com 18 anos de idade. “As coisas que eu mais gosto são dançar e jogar bola, mas o Balandê é mais importante”, diz Rodrigo que brinca o Balandê desde que tinha 13 anos e conta com orgulho das viagens que fez e das cidades que conheceu através de sua arte. “Antes eu achava feio, mas hoje eu acho bom demais”, conta Aline.

O próprio Jorginho coloca a esposa e os três filhos pequenos para dançar o Balandê-Baião. O fato de os jovens de Monsenhor Gil abraçarem essa dança secular é uma prova de que a herança deixada pelo mestre Zé Coelho está bem encaminhada.

 

Com informações do site do governo do estado do Piauí por Carlos Lustosa Filho

Balandê Baião – Monsenhor Gil
Foto: Regis Falcão

 

Tags:

 
 

Sobre o Autor

Mais notícias de

 

 

 

Adicionar um comentário

required

required

optional